Mata Atlântica: quatro décadas de transformações e pressão sobre a vegetação nativa

Novo levantamento do MapBiomas revela avanços da agricultura, desaceleração do desmatamento e mudanças estruturais no uso da terra entre 1985 e 2024

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green trees on mountain under blue sky during daytime
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Bioma mais desmatado do Brasil, a Mata Atlântica chega a 2024 com apenas 31% de cobertura vegetal natural. A perda acumulada ao longo de séculos de ocupação humana se reflete nos 67% da área ocupados por usos antrópicos — principalmente agricultura, que quase dobrou de área desde 1985, segundo a nova Coleção 10 de dados do MapBiomas.

O avanço histórico da ocupação humana é nítido. Em 1985, restavam apenas 27% da área florestal original. Desde então, o ritmo do desmatamento variou ao longo das décadas, e após a promulgação da Lei da Mata Atlântica, observa-se até um leve crescimento da área florestada. A década mais crítica foi a de 1985 a 1994, quando 4,7 milhões de hectares foram convertidos para agropecuária. Nos anos seguintes, o ritmo caiu, e entre 2005 e 2014 houve ganho líquido de 200 mil hectares — o único período em que a recuperação superou a perda.

Entre 2015 e 2024, o equilíbrio voltou a preocupar: desmatamento e regeneração apresentam volumes semelhantes. Mesmo com a desaceleração do ritmo nas últimas décadas, os últimos cinco anos registraram média de 190 mil hectares de desmatamento por ano, metade deles em florestas maduras com mais de 40 anos, essenciais para biodiversidade e serviços ecossistêmicos.

Dinâmica da vegetação nativa

A perda acumulada de florestas entre 1985 e 2024 chega a 2,4 milhões de hectares, equivalente a 8,1% da área florestada existente no início da série. Quando considerada toda a vegetação nativa — florestas, formações campestres, restinga e manguezais — a redução chega a 11,5% em 40 anos.

As formações campestres foram especialmente afetadas, com retração de 28% desde 1985 e perdas constantes desde 2000. Nos últimos 24 anos, 15% do desmatamento de vegetação primária no bioma ocorreu nesse tipo de formação, indicando pressão crescente sobre áreas abertas naturais.

Apesar das perdas, há diferenças regionais importantes. Rio de Janeiro e São Paulo foram os únicos estados a apresentarem aumento da vegetação nativa no período. Já em 2024, os estados com maior proporção de vegetação natural dentro do bioma foram Santa Catarina (45%), Rio Grande do Sul (40%) e Bahia (39%).

A força da agricultura na transformação do bioma

A agricultura é hoje o uso que mais avança sobre a Mata Atlântica. Em 2024, o bioma concentra 33% de toda a agricultura do país e ampliou sua área agrícola em 96% desde 1985 — um crescimento de 10 milhões de hectares. A expansão ocorreu majoritariamente sobre áreas de pastagem, que perderam 8,5 milhões de hectares no mesmo período. Apenas 10% da agricultura atual ocupa áreas que eram vegetação natural em 1985.

A lavoura temporária domina a paisagem agrícola, com 95% da área cultivada. A soja foi a cultura que mais cresceu, com expansão de 343% e aumento de 8,3 milhões de hectares, representando 26% da área nacional da cultura — com o Paraná respondendo por mais da metade desse volume. A cana-de-açúcar também avançou fortemente, crescendo 256% e concentrando 66% de sua área nacional dentro do bioma, principalmente em São Paulo.

Entre as lavouras perenes, café e citrus tiveram forte expansão. O café cresceu 105% e hoje 70% da produção nacional está na Mata Atlântica, com Minas Gerais liderando. O citrus aumentou 200%, com São Paulo respondendo pela imensa maioria da área cultivada dentro do bioma.

Silvicultura e expansão urbana

A silvicultura multiplicou sua área por cinco em quatro décadas, chegando a 4,5 milhões de hectares em 2024. Mais da metade de toda a silvicultura brasileira está no bioma, com Santa Catarina, Paraná e Bahia somando 60% da atividade. Cerca de 57% da área atual já era antropizada em 1985, mostrando que boa parte da expansão ocorreu sobre áreas previamente modificadas.

A urbanização também se acelerou. A Mata Atlântica concentra 51% da área urbanizada do país e dobrou sua ocupação urbana desde 1985 — um crescimento de 133%. A maior parte dos municípios tem áreas urbanas pequenas, mas três capitais destoam: São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba, todas com mais de 30 mil hectares urbanizados.