Inoculante multiespécies da Embrapa promete revolucionar a recuperação de áreas degradadas no Brasil
Nova tecnologia reúne microrganismos capazes de atender 31 espécies florestais leguminosas, reduzindo custos, ampliando a eficiência e acelerando projetos de restauração ecológica em todos os biomas
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Pesquisadores da Embrapa Agrobiologia (RJ) desenvolveram um inoculante biológico de amplo espectro capaz de atender pelo menos 31 espécies florestais leguminosas. A inovação representa um salto para ações de restauração ambiental, pois amplia o alcance de uma técnica utilizada desde a década de 1990 para recuperar solos severamente degradados — como áreas mineradas, erodidas ou ocupadas de forma desordenada. Com o novo produto, em fase final de desenvolvimento, o mercado brasileiro de bioinsumos ganha uma solução mais simples, versátil e acessível.
A tecnologia se baseia em décadas de pesquisa. Das mais de 800 estirpes de rizóbios isoladas pela Embrapa, duas foram selecionadas pela capacidade de estabelecer simbiose eficiente com dezenas de espécies florestais. Essa compatibilidade ampla elimina uma das principais barreiras da técnica: a alta especificidade entre bactérias e plantas hospedeiras. Com isso, viveiristas e restauradores passam a contar com um único insumo capaz de atender diferentes espécies, sem perda de eficiência na fixação biológica de nitrogênio.
Da mineração à recomposição florestal: 30 anos de avanços
O desenvolvimento do inoculante é resultado de uma trajetória iniciada nos anos 1990, quando a Embrapa buscava alternativas para regenerar áreas totalmente degradadas pela mineração. No início, menos de dez espécies leguminosas eram testadas, mas hoje o banco de dados inclui centenas de espécies adaptadas a diversos biomas, da Amazônia ao Semiárido. Segundo o pesquisador Alexander Resende, esse avanço possibilitou mapear combinações eficientes entre plantas e microrganismos para quase todas as condições de solo e clima do País.
A lógica da tecnologia está na atuação invisível dos microrganismos. Rizóbios colonizam raízes, formam nódulos e fixam nitrogênio atmosférico; fungos micorrízicos ampliam a absorção de água e nutrientes. Juntos, esses organismos potencializam o crescimento vegetal mesmo em solos extremamente pobres, geram matéria orgânica, restabelecem a ciclagem de nutrientes e criam condições para o retorno de outras espécies vegetais. “O que fazemos é otimizar uma simbiose natural para reconstruir a fertilidade e preparar o terreno para a biodiversidade”, explica o pesquisador Eduardo Campello.
Resultados consistentes em campo e impactos ambientais diretos
A aplicação da técnica apresenta resultados sólidos em diversos biomas. Projetos já recuperaram áreas de mineração de bauxita e ferro na Amazônia e em Minas Gerais, jazidas de piçarra no Rio Grande do Norte e encostas degradadas no Rio de Janeiro. Na Caatinga e no Cerrado, a tecnologia segue como uma das mais eficientes para reverter processos erosivos. Os primeiros sinais de recuperação surgem em cerca de 12 meses, e após quatro a cinco anos, as áreas assumem o aspecto de uma “floresta jovem”. Em até uma década, mais de 40 novas espécies passam a colonizar os locais espontaneamente.
Além da restauração ecológica, há benefícios ambientais imediatos: o inoculante reduz a necessidade de adubação nitrogenada mineral, diminuindo perdas de nitrogênio para a atmosfera e águas subterrâneas. Como aproximadamente 50% do nitrogênio aplicado via fertilizantes convencionais é perdido, a substituição por bioinsumos representa economia, redução de emissões e atendimento a metas ambientais como o Planaveg, o Código Florestal e os compromissos assumidos no Acordo de Paris.
Parcerias e os próximos passos da tecnologia
O avanço só foi possível graças à colaboração entre instituições públicas, universidades e empresas privadas, incluindo CNPq, Capes, Faperj, Faped, Alcoa, Vale, Petrobras e outras organizações. Agora, a Embrapa planeja ampliar testes com o inoculante multiespécies, estabelecer protocolos de produção com a indústria de bioinsumos e capacitar viveiristas em todo o País para que a tecnologia chegue ao campo em larga escala.
Essa etapa é decisiva para consolidar o Brasil como referência em soluções baseadas na natureza — especialmente em um momento em que o mundo discute restauração ecológica e o País se prepara para sediar a COP30 na Amazônia.
Voçorocas: quando a erosão rasga a terra — e como a ciência pode curá-la
As voçorocas, grandes crateras erosivas conhecidas como “terras rasgadas”, são um dos problemas ambientais mais graves e antigos do Brasil. Há casos com mais de 50 metros de profundidade e milhares de metros quadrados, formados ao longo de séculos de uso inadequado do solo. Estudos da Embrapa Agrobiologia identificaram 154 voçorocas apenas na bacia do rio Barra Mansa (RJ), totalizando cerca de 3 milhões de metros cúbicos de solo perdido.
A solução, segundo especialistas, já é conhecida: manter o solo coberto, reintroduzir vegetação adequada e usar espécies capazes de melhorar estrutura e fertilidade — entre elas, justamente as leguminosas inoculadas com microrganismos benéficos. Elas fixam nitrogênio, produzem matéria orgânica, estabilizam o terreno e criam condições para que outras plantas retornem, revertendo impactos que pareciam irreversíveis.
Assim, a combinação entre ciência do solo, microbiologia e manejo ecológico mostra que é possível reconstruir paisagens degradadas, restaurando produtividade, biodiversidade e segurança ambiental em regiões afetadas pela erosão e pela degradação extrema.
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